ANÁLISE DO LIVRO
MEMÓRIAS DE UM SARGENTO DE MILÍCIAS, DE MANUEL ANTÔNIO DE ALMEIDA.
Numa
viagem, rumo à colônia, Leonardo-Pataca conhece Maria das Hortaliças.Os dois se
apaixonam e ao chegarem ao Brasil estabelecem matrimônio. Desse matrimônio
resulta um fruto, a saber: Leonardo.
Um dia
Leonardo-Patacaflagra Maria das Hortaliças com outro homem, uma briga acontece
e ele resolve sair de casa, mas quando retorna descobre que a mulher fugiu com
um de seus amantes. Com o fim do matrimônio, Leonardo-Pataca decide mudar de
vida e abandona o filho sob os cuidados de seu padrinho, que era barbeiro e
cuja barbearia ficava ao lado de sua casa.
O padrinho almejava para Leonardo um futuro
eclesiástico, porém o garotonão apresentava a mínimainclinação para o
sacerdócio, ao contrário, mostrava-se bastante traquinas e avesso as coisas da
Igreja. Leonardo crescia e não fazia questão de estudar e nem de trabalhar,
tornando-se assim um típico malandro dos subúrbios carioca, mas as coisas
mudaram quando ele conhece Luizinha, sobrinha de D. Maria, uma antiga amiga do
padrinho.
Leonardo se
enamora por Luizinha, cujo afeto ele tem que disputar com José Manuel, que por
sua vez, está interessado na herança que Luizinha herdara de sua tia, Dona
Maria. Com a ajuda de sua deseu padrinho e de sua comadreLeonardo consegue afasta
José Manuel de Luizinha.
Por esse
período, o padrinho de Leonardo falece, e ele se vê forçado a morar, novamente,
com o pai, Leonardo Pataca, por quem foi abandonado. Certo dia,Leonardo teve
uma discussão com a atual mulher de seu pai e este tomando as dores daquela,
afugenta Leonardo de sua casa ameaçando mata-lo com uma espada.
Na noite em
que foi expulso de casa, Leonardo reencontrou um antigo amigo com quem
aprontava muitas traquinagens na Igreja, nessa ocasião, este amigo o convidou
para ir morar em sua casa ao que Leonardo não demorou a aceitar.Estando na casa
de seu amigo, Leonardo conhece e se apaixonapor Vidinha, todavia esse afeto com
Vidinha não agradou a dois primos que tinham pretensões de com ela se casar.
Juntos, os
dois primos armam uma cilada para Leonardo, eles o acusam de vadiagem e provocam
uma emboscada para que Vidigal o prendesse. Vidigal prende Leonardo quando este,
Vidinha e seus primos saiam para uma patuscada,porém Leonardo consegue se
desvencilhar e fugir de Vidigal e seus Granadeiros quando estavam a caminho da
casa da guarda.
Depois deste incidente, Leonardoconseguiu um
emprego na Ucharia Real. Por essa razão, Vidigal não pôde prendê-lo, mas ele se
envolveu com a mulher do "toma-largura" epor esse motivo ele foi
preso pelochefe Vidigal.
Nesse meio
tempo, Luizinha casou-se com José Manuel que a tratava muito mal. Vidinha que
ficou muito enciumadadecidiu tomar satisfações com a esposa do
"toma-largura", porém o que acabou acontecendo é que o
"toma-largura" se apaixonou por Vidinha. Enquanto isso, Leonardo se
tornava policial, já que conhecia bastante da vida marginal.
Leonardo, por
sua inclinação para traquinagens acabavapor ajudar os bandidos, por essa razão,
foi ele preso e punido com chibatadas por Vidigal. Para conseguir a libertação
de Leonardo, a comadre se uniu a Maria-Regalada, antigo amor de Vidigal, e
Juntas conseguem a libertação de Leonardo e para, além disso,alcançam que ele
seja promovido a sargento. Com a morte de José Manuel, Leonardo teve livre
acesso para reconquistar seu primeiro amor, Luizinha e então todos viveram
felizes para sempre.
PERSONAGENS
Em memórias
de um sargento de milícias, os personagens são, basicamente, planos, isto quer
dizer que eles não mudam seu comportamento com desenrolar dos fatos. Pode-se
dizer queOs personagens deste romance se destacam por traços mais comuns ao
grupo em que pertencem. As personagens, em sua grande maioria, não são
mencionadas por seus nomes, e sim por seu tipo, ou profissão: toma-largura,
comadre, parteira, barbeiro, primo. Neste trecho ele descreve a comadre e em
nenhum momento do livro o autor fala o seu nome
Os
personagens centraisda trama são: Leonardo, Luizinha, o Padrinho, a Madrinha,
mas há também os secundários, e são eles: Leonardo-Pataca, Maria das
Hortaliças, o major Vidigal, José Manuel, Vidinha, D. Maria.
PERSONAGENS
Leonardo
Desde
criança Leonardo mostrava-se ser um perfeito vadio, pois não queria nada com os
estudos e nem com trabalho. Apesar de todos os apelos do padrinho que, queria
fazer dele um padre, no final das contas o garoto seguiu a sua sina de
malandro, como retrata o trecho a seguir:
Digamos unicamente que durante todo esse tempo o menino não
desmentiu aquilo que anunciara desde que nasceu: atormentava a vizinhança
sempre com um choro em oitava alta; era colérico; tinha ojeriza particular à
madrinha, a quem não podia encarar, e era estranhão até não poder mais. (pag.
17)
Luizinha
Se tratava
do grande amor de Leonardo. Luizinha era órfã de pai e mãe e foi adotada pela
tia, D. Maria, que conseguiu se tornar a tutora da menina após uma briga na
justiça com o tio paterno dela:
Era a sobrinha de D. Maria já muito desenvolvida, porém que, tendo
perdido as graças de menina, ainda não tinha adquirido a beleza de moça; era
alta, magra, pálida; andava com queixo enterrado no peito, trazia as pálpebras
sempre baixas e olhava a furto; tinha os braços finos e compridos; o cabelo,
cortado, dava-lhe apenas até o pescoço, e como andava mal penteada e trazia a
cabeça sempre baixa, uma grande porção lhe caía sobre a testa e olhos como uma
viseira. (pag. 85)
O Padrinho
Era o
barbeiro, cuja barbearia, ficava ao lado da casa de Leonardo-Pataca. Depois que
Pataca foi abandonado por Maria das Hortaliças entregou aos cuidados do
Padrinho o menino Leonardo. O padrinho era um homem bom, mas que conseguiu
constituir algum patrimônio graças a um golpe que deu em um moribundo.
O capitão chamou à parte, e em segredo lhe fez entrega de uma
cinta de couro e uma caixa de pau pejadas de um bom par de dobraras em ouro e
prata, pedindo que finalmente as fosse entregar, apenas chegasse à terra, a uma
filha sua, cuja morada lhe indicou. Além deste dinheiro, encarregou também de
receber a soldada e lhe dar o mesmo destino (...). O compadre decidiu
instituir-se herdeiro do capitão, e assim o fez. Eis aqui como se explica o arranjei-me (grifo do autor), e como se
explicam muitos outros que vão aí pelo mundo. (pag. 46)
A Madrinha
A Madrinha
era uma mulher extremamente religiosa que muito gostava de seu afilhado,
Leonardo, pois por causa dele, ela fez muitas coisas, inclusive levantar uma
injúria contra José Manuel para afastá-lo de Luizinha e deixar o caminho livre
para Leonardo:
Era a comadre uma mulher baixa, excessivamente gorda, bonachona,
ingênua ou tola até um certo ponto, e finória até outro; vivia do oficio de
parteira, que adotara por curiosidade, e benzia de quebranto; todos a conheciam
por muito beata e pela mais desabrida papa-missas da cidade.(pag. 38)
Leonardo-Pataca
Era o pai
de Leonardo. Após ter flagrado a mulher em adultério dentro de sua própria
casa, teve ainda de passar pela humilhação de saber que a esposa fugira com
outro homem para Portugal. Pataca era extremamente passional e por essa razão
passou por diversas provações em todos os relacionamentos.Primeiro com Maria
das Hortaliças, depois com a cigana e por fim com Chiquinha.
(...) depois da fuga de Maria, e das cinzas ainda quentes de um
amor mal pago nascera outro que também não foi a este respeito melhor
aquinhoado; mas o homem era romântico, como se diz hoje, e babão, como se dizia
naquele tempo, não podia passar sem uma paixãozinha. (pag.28)
Maria das Hortaliças
Era a
esposa de Leonardo-Pataca, mãe de Leonardo, o protagonista da história. Maria
das Hortaliças aparece nos primeiros capítulos. Foi pega pelo marido com outro
homem e depois fugiu para Portugal com seu amante, abandonado seu filho sob os
cuidados do padrinho dele.
O Major Vidigal
O Major Vidigal era o chefe de policia, uma espécie de
Xerife muito temido por causa de seus métodos empregados, que eram extremamente
rigorosos e ele não fazia nenhum tipo de concessão, pois fosse quem fosse ele
prenderia.
O major Vidigal era o rei absoluto, o arbitro supremo de tudo que
dizia respeito a esse ramo de administração; era o juiz que julgava e
distribuía a pena, e ao mesmo tempo o guarda que dava caça aos criminosos; nas
causas de sua imensa alçada não havia testemunhas, nem provas, nem razões, nem
processo; ele resumia tudo em si; a sua justiça
(grifo do autor) era infalível; não havia apelação das sentenças que dava,
fazia o que queria, e ninguém lhe tomava contas. Exercia enfim uma espécie de
inquisição policial. (pag. 30)
José Manuel
José Manuel era o pretendente de Luizinha e principal
oponente de Leonardo para conquistar o amor da moça. Ele era conhecido por ser
demasiado maledicente e mentiroso. Casou-se com Luizinha somente por interesse
em sua herança.
Um homenzinho nascido em dias de maio, de pouco mais ou menos 35
anos de idade, magro, narigudo, de olhar vivo e penetrante, vestido de calção e
meias pretas, sapatos de fivela, capote e chapéu armado (...) José Manuel era
uma crônica viva, porém crônica escandalosa, (...) debaixo do mais fútil
pretexto tomava a palavra, e enfiava um discurso de duas horas sobre a vida de
fulano ou de beltrano. (pag. 93)
Vidinha
Vidinha era a prima do melhor amigo de Leonardo, aquela
por quem ele se apaixonou. Vidinha era de caráter sempre muito alegre, pois
vivia sempre sorridente. Ela sabia cantar e tocar viola.
Vidinha era uma mulatinha de 18 a 20 anos, de altura regular,
ombros largos, peito alteado, cintura fina e pés pequeninos; tinha os olhos
muito pretos e muitos vivos, os lábios grossos e úmidos, os dentes alvíssimos,
a fala era um pouco descansada, doce e afinada. (pag. 128)
D. Maria
D. Maria era a tia de Luizinha e amiga do padrinho de
Leonardo. Era uma mulher rica e de coração muito bom, pois ajudava aos pobres e
era benfazeja, todavia ela tinha um vício considerado terrível para aqueles
tempos: se tratava da mania das demandas.
D. Maria tinha bom coração, era benfazeja, devota e amiga dos
pobres, porém em compensação dessas virtudes tinha um dos piores vícios
daqueles tempos e daqueles costumes: era a mania das demandas. Como era rica,
D. Maria alimentava este vicio largamente; as suas demandas eram o alimento da
sua vida; acordada pensava nelas, dormindo sonhava com elas, raras vezes
conversava em outra coisa, e apenas achava um tangente caía no assunto
predileto; pelo hábito que tinha da matéria; entendia do riscado a palmo, e não
havia procurador que a enganasse, sabia todos aqueles termos jurídicos e toda a
marcha de modo tal que ninguém lhe levava nisso a palma. (pag.79)
TEMPO E
ESPAÇO
TEMPO
Cronologicamente, a história descrita no Romance acontece no inicio do
século XIX, período em que a corte portuguesa chega ao Brasil. Para tanto,
basta verificar a expressão com a qual o narrador inicia a narrativa: “Era no
tempo do rei” (pag. 13), numa alusão direta aorei Dom João VI. Essaexpressão é,
também, uma forma que o autor encontrou para fazer lembrar, de maneira irônica,a
famosa expressão utilizada para introduzir os contos de fadas, Era uma vez...
ESPAÇO
O espaço físico em que se
situa a narrativa é o meio urbano brasileiro.A história se passa no Rio de
Janeiro, e faz referência a seus principais pontos como igrejas, as ruas mais
importantes, bem como o subúrbio carioca e para, além disso, descreve também
lugares como acampamentos de ciganos. O autor faz uma descrição de um
acampamento cigano.
“Moravam ordinariamente um pouco arredados das ruas populares, e viviam
em plena liberdade. As mulheres trajavam com certo luxo relativo aos seus
haveres: usavam muito de rendas e fitas; davam preferência a tudo quanto era
encarnado, e nenhuma delas dispensava pelo menos um cordão de ouro ao pescoço;
os homens não tinham outra distinção mais do que alguns traços fisionômicos
particulares que os faziam conhecidos”. (pag.35)
FOCO NARRATIVO
A narraçãoda história é feita de maneira cronológica e linear, por um narrador que fala na 3º pessoa e que tem conhecimento de todas as ações dos personagens e que pode ponderar sobre o que lhes vem à mente. Em determinados momentos o narrador lança mão do discurso direto para evidenciar a maneira como falam as personagens.
Já... já... senhora intrometida com a vida alheia... já sabe o
padre-nosso, e eu o faço rezar todas as noites um pelo seu defunto marido que
está a esta hora dando coices no inferno!...(pag. 34)
O narrador usa de ironias
para achincalhar alguns costumes da época em que é contada a história:
Ser valentão foi em algum tempo ofício no Rio de Janeiro; havia
homens que viviam disso: davam pancada por dinheiro, e iam a qualquer parte
armar de propósito uma desordem, contanto que se lhes pagasse, fosse qual fosse
o resultado.Entre os honestos cidadãos
que nisto se ocupavam(grifo meu), havia, na época desta história, um certo
Chico-Juca, afamadíssimo e temível. (pag. 70)
Na
contramão dos demais autores românticos, Manuel Antônio de Almeida retira o
foco narrativo dos grandes salões aristocráticose direciona para as massas
desfavorecidas, para o subúrbio, para a gente simples da cidade do Rio de Janeiro.
A seguir se verá um trecho em que o narrador faz uma descrição do Fado, típica
dança das classes baixas:
Todos sabem o que é Fado, essa dança tão voluptuosa, tão variada,
que parece filha do mais apurado estudo da arte. Uma simples viola serve melhor
do que instrumento algum para o efeito. O Fado tem diversas formas, cada qual
mais original. Ora, uma só pessoa, homem ou mulher, dança no meio da casa por
algum tempo, fazendo passos os mais dificultosos, tomando as mais airosas
posições, acompanhando tudo isso com estalos que dá com os dedos, e vai depois,
pouco a pouco, aproximando-lhe de qualquer que lhe agrada; faz-lhe diante
algumas negaças e viravoltas, e finalmente bate palmas, o que quer dizer que a
escolheu para substituir o seu lugar. (pag. 36)
Um aspecto importante
na obra de Manuel Antônio de Almeida é a exaltação de personagens típicos dos
subúrbios fluminenses, como o barbeiro, a parteira, o major e dessa forma eleva
a história mais próxima do leitor comum. Como a obra “Memórias de um sargento
de Milícias” foi escrita em capítulos, e esses capítulos foram publicados um de
cada vez (folhetim) no final de alguns capítulos o autor coloca um ponto de
suspense fazendo com que o leitor tenha vontade de ler o próximo capítulo, essa
característica é utilizada atualmente em novelas, com a finalidade de fazer o
telespectador esperar o próximo capítulo.
Apesar de
ser uma obra romântica, o autor mostra uma perspectiva bem próxima da realidade
e bem menos idealizada do que aquela que a maioria dos romancistasromânticos
adotaram. Os problemas sociais, as atitudes dos personagens e uma visão menos
idealizada do amor mostram a obra com Realismo.
CONCLUSÃO
O Romance Memórias
de um sargento de Milícias, de Manuel Antônio de Almeida é uma obra ligada a
escola Romântica que, todavia, apresenta características diversas como visão
subjetiva da mulher anada e a vitória do primeiro amor, o amor verdadeiro,
sobre as demais paixões mundanas.
Esta obra é
um romance urbano que desenvolveu temas ligados à vida social. Apesar de
possuir características fundamentais do movimento romântico, a história não apresenta
os exageros sentimentais comuns a esta escola, ao contrário o narrador parecer
ironizar alguns procedimentos românticos, como é possível verificar:
Portanto não foram de modo algum mal recebidas as primeiras
finezas as primeiras finezas de Leonardo, que desta vez se tornou muito mais
desembaraçado, quer por que já o negócio com Luisinha tivesse desasnado, quer
por que agora fosse a paixão mais forte, embora esta última hipótese vá de
encontro a opinião dos ultrarromânticos, que põe todos os bofes pela boca pelo
tal primeiro amor: no exemplo que nos dá o Leonardo, aprendam o que ele tem de
duradouro. (pag. 141)
Começa-se a
perceber que no livro Memórias de um Sargento de milícias existe uma forte
inclinação para as temáticas realistas, pois o autor abandona a linguagem hiperbólica
e a mulher e o amor já não são tão idealizados como nos demais romancesRomânticos,
porém a vitória do primeiro amor, o final feliz de Luisinha e Leonardo mostra
que o texto apesar de ter características realistas, ainda tem predominância o
romantismo.
BIBLIOGRAFIA
ALMEIDA, Antônio Manuel de. Memórias de um sargento de
milícias. Ed. São Paulo: Martin Claret, 2007.
ANDRADE, Mário de. "Introdução", in Memórias
de um sargento de milícias.
BOSI, Alfredo. História concisa da literatura
brasileira. 41ª. Ed. São Paulo: Cultrix, 1994.
Disponível em:http://inforum.insite.com.br/493/3064151.html
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