O MODERNISMO PORTUGUÊS
O Modernismo português, assim como os demais
movimentos literários que o antecederam, foi influenciado pelo contexto
histórico e político pelo qual passava este país. Portugal testemunhava os estragos
causados pela Primeira Guerra Mundial em toda Europa, a Revolução Industrial e
o clima de nostalgia que tomava conta dos Lusitanos por perceberem que suas
glórias de tempos passados haviam caído no esquecimento.
Como alternativa para a literatura produzida
por aquela época surge a revista Orpheu, que apresentaria as inovações de ordem
literária e estética pela qual a arte portuguesa estava passando, o que acabou
culminando no Modernismo português em 1915.
Já na sua primeira edição a revista Orpheu trazia
um artigo em que enfatizava as inovações estéticas trazidas pelos movimentos de
vanguarda, sobretudo a corrente Futurista que pregava a valorização das máquinas
e da velocidade em um poema de Alberto Caeiro, um dos heterônimos de Fernando
Pessoa e este juntamente com Mário de
Sá-Carneiro, Luís Montalvor e José de Almada-Negreiros, compunha um grupo de
artistas com bastante expressividade no cenário do Modernismo português.
Diante desse contexto, deve-se
destacar Fernando Pessoa, poeta que com o seu gênio criativo inventou diversos
“eus”. Fernando Pessoa deu vida a vários heterônimos, cada um com suas particularidades
literárias. Dentre os heterônimos mais importantes de Fernando Pessoa estão:
Alberto Caeiro, Álvaro de Campos e Ricardo Reis.
O QUE É UM HETERÔNIMO
Um Heterônimo é uma personagem fictícia, criada por
escritores, como é o caso de Fernando Pessoa, cujo objetivo é dar vasão a
diferentes formas de tentar descrever a as diversas perspectivas do mundo. Os três
principais heterônimos de Fernando Pessoa são: Álvaro de Campos, Alberto Caeiro
e Ricardo Reis.
BIOGRAFIA RICARDO REIS
Para instrumento de análise da presente
dissertação, destaca-se o heterônimo Ricardo Reis, nascido no Porto, no dia 19 de Setembro de 1887, foi educado em uma escola jesuítica. Ricardo Reis
obteve educação greco-latina, formou-se em medicina, profissão que não exerceu,
e expatriou-se, espontaneamente, para Brasil no ano de 1919, após a derrota da
rebelião monarquista contra a república Portuguesa.
Em 1914, iniciou sua produção literária lançando
mão da ode, como forma poética mais frequente. Fernando Pessoa não fixa uma
data em especial para o falecimento de Ricardo Reis, ao contrário de seus
demais heterônimos, todavia o escritor José Saramago define uma data em seu famoso
livro “O ano da morte de Ricardo Reis”.
SOBRE A PRODUÇÃO POÉTICA DE
RICARDO REIS
Inicialmente
as obras de Ricardo Reis foram publicadas na
revista Athena, no ano de 1924, revista esta fundada por Fernando Pessoa.
Depois foram publicados oito odes, entre 1927 e 1930, na revista Presença,
de Coimbra. Ricardo Reis era discípulo de Alberto Caeiro, outro heterônimo de
Fernando Pessoa, que se caracterizava pela serenidade e calma com que enxergava
a existência, por isso, Ricardo Reis inspirado pela clareza, pelo equilíbrio e pela
ordem do seu espírito clássico, procurava
atingir a paz e o equilíbrio sem sofrimento.
Para o poeta Ricardo Reis a tranquilidade da
alma deve ser alcançada por meio do aproveitamento da vida (carpe diem) através das coisas mais
simples e de maneira tranquila, sem excessos, fazendo da vida no campo o seu
ideal (fugere urbe), e ainda fugindo
da dor e não temendo a morte, já que esta é a única certeza da vida. Ricardo
Reis também apresenta conformismo e renúncia diante dos acontecimentos e não se
esforça para mudar o que ele denomina de destino, sobre este tema ele fala no
poema abaixo:
Cada um cumpre o destino que lhe cumpre,
E deseja o destino que deseja;
Nem cumpre o que deseja,
Nem deseja o que cumpre.
E deseja o destino que deseja;
Nem cumpre o que deseja,
Nem deseja o que cumpre.
Como as pedras na orla dos canteiros
O Fado nos dispõe, e ali ficamos;
Que a Sorte nos fez postos
Onde houvemos de sê-lo.
O Fado nos dispõe, e ali ficamos;
Que a Sorte nos fez postos
Onde houvemos de sê-lo.
Não tenhamos melhor conhecimento
Do que nos coube que de que nos coube.
Cumpramos o que somos.
Nada mais nos é dado.
Do que nos coube que de que nos coube.
Cumpramos o que somos.
Nada mais nos é dado.
O eu poético neste poema aceita o destino de uma forma tranquila, sem
tentativas de mudá-lo, não alimentando desejos ou esperanças, pois “Nada mais
nos é dado”, também revela o seu conformismo diante do destino, não vale a pena
desejar, não vale a pena ter esperanças, porque a nossa vida será apenas como
foi programada e o melhor é aceitar isso com dignidade. Podemos inferir ainda,
por meio da leitura da ode o modo como não cumprimos o que desejamos, ou seja, não
conseguimos o que desejamos nem desejamos o que cumprimos. É o Destino que
decide por nós, e nós apenas cumprimos a vontade do Destino.
Em se tratando de
renúncia, destaquemos essa e outras temáticas na ode abaixo:
Segue o teu destino,
Rega as tuas plantas,
Ama as tuas rosas.
O resto é sombra
De árvores alheias.
A realidade
Sempre é mais ou menos
Do que nós queremos.
Só nós somos sempre
Iguais a nós-próprios.
Suave é viver só.
Grande e nobre é sempre
Viver simplesmente.
Deixa a dor nas aras
Como ex-voto aos deuses.
Vê de longe a vida.
Nunca a interrogues.
Ela nada pode
Dizer-te. A resposta
Está além dos deuses.
Mas serenamente
Imita o Olimpo
No teu coração.
Os deuses são deuses
Porque não se pensam.
Nesta ode, o eu poético vive a vida sem ilusões, não busca
prazer na mesma, renunciando a tudo, de maneira nobre, fria e estática, renúncia
esta vida que trará, posteriormente, a tranquilidade. O eu poético ainda cultua
diversos deuses e o belo, herança dos gregos clássicos, bem como, procura fugir
da dor, recomendado: vive só e deixa a dor nas aras como ex-votos aos deuses,
quer estar só e deixar de sofrer. No que refere à estética, utiliza-se dos
verbos no infinitivo, como se o eu poético quisesse demonstrar ensinamentos aos
discípulos. No poema abaixo reconheçamos o conformismo na poesia de Ricardo
Reis:
Não quero recordar nem conhecer-me.
Somos demais se olhamos em quem somos.
Ignorar que vivemos
Cumpre bastante a vida.
Somos demais se olhamos em quem somos.
Ignorar que vivemos
Cumpre bastante a vida.
Tanto quanto vivemos, vive a hora
Em que vivemos, igualmente morta
Quando passa conosco,
Que passamos com ela.
Em que vivemos, igualmente morta
Quando passa conosco,
Que passamos com ela.
Se sabê-lo não serve de sabê-lo
(Pois sem poder que vale conhecermos?)
Melhor vida é a vida
Que dura sem medir-se.
(Pois sem poder que vale conhecermos?)
Melhor vida é a vida
Que dura sem medir-se.
Segundo o
eu poético, devemos viver o presente sem pensar ou recordar o passado, porque
não podemos evitar que o tempo passe, pois todo o presente se converte
rapidamente em passado e por isso é inútil conhecer e rejeitar a recordação do
passado ou o autoconhecimento para se concentrar na perspectiva do ser como
existência.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A poesia de Ricardo Reis tem muitas referências mitológias, com uma
linguagem culta e precisa. O estilo neoclássico é influência, sobretudo, do
poeta latino Horácio, com utilização frequente da ode. Ricardo Reis faz uso de
um vocábulo culto e alatinado tendo como principal recurso estilistico o hipérbato.
Emprego do gerúndio e do imperativo (ou conjuntivo com valor de imperativo) com
carácter exortativo, ao serviço do tom sentencioso e do carácter moralista em
sua produção poética.
A um só tempo, Ricardo Reis une epicurismo e estoicismo, faz um louvor
da vida no campo através do fugere urbe, a
exemplo dos poetas árcades. A poesia de Ricardo Reis é permeada de uma completa
consciência da efemeridade da existência e da noção de que o destino é superior
aos anseios da condição humana.
Referencial
bibliográfico
CEREJA, William
Riberto. Panorama da Literatura Portuguesa. 2ª ed. rev. amp.São Paulo:
Atual, 1997.
De NICOLA, José. Língua, literatura e
produção de textos. São Paulo: Scipione, 2009.
Disponivel em:
acesso em 20/01/11
PESSOA, Fernando.
Obra Poética. Rio de Janeiro: Editora Nova Aguilar, 2003.
Isto ajudou-me imenso obrigada por postares. :)
ResponderExcluirFico muito feliz em saber que te ajudei. Obrigado pelo retorno.
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