3/04/2013

Vonnegut e o tremor de tempo

 

Durante as férias dos meses de Janeiro e Fevereiro, comprei alguns livros em uma loja no centro de Macapá, entre esses livros que, diga-se de passagem, estavam com preços bem acessíveis e, portanto, cabíveis ao meu parco orçamento, encontrei uma obra fantástica de um autor até então desconhecido de mim e de grande parte de meus amigos leitores. O livro do qual estou falando é “Timequake” do escritor Estadunidense Kurt Vonnegut. É uma das últimas produções literárias de Vonnegut - falecido no ano de 2007 em circunstâncias trágicas.


O romance conta a história de um tremor de tempo ocorrido em 13 de fevereiro de 2001 que fez com que o universo parasse de se expandir e regredisse até o dia 17 de fevereiro de 1991. Ao contrário da maioria dos livros e filmes de ficção científica em que os personagens voltam no tempo para mudar seus destinos, em “Timequake” Vonnegut foge a esse clichê e obriga os seus personagens a fazerem as mesmas coisas que tinham feito antes. Dez anos de um completo flash Bach.


         O texto de “Timequake” é recheado de referências autobiográficas, desde o massacre da cidade de Dresden, em 1945, que o autor presenciou, até a morte de seus dois irmãos, Bernard e Allie, e da primeira esposa, Jane, vítimas do câncer. Os principais acontecimentos da vida de Kurt Vonnegut se misturam com o cotidiano dos personagens Kilgore Trout (alter ego do escritor), Monica Pepper, Zoltan Pepper e Dudley Prince; o próprio Vonnegut se torna uma personagem, na medida em que utiliza o enredo para rememorar fatos marcantes de sua existência, com um tom saudosista de quem já está se despedindo



Considero Kurt Vonnegut um escritor de excelência e que, sem dúvida, recebeu a influência de mestres da literatura moderna como Aldous Huxley, George Orwell e outros, todavia a crítica ao progresso tecnológico por parte de Vonnegut é amenizada pelo tom irônico e bem humorado de sua escrita, isso o difere dos escritores acima citados. 



Abaixo segue um trecho de Timequeke:





"Agora imaginem o seguinte. Um homem cria uma bomba de hidrogênio para uma União Soviética paranóica, certifica-se de que ela funcione e, depois, ganha o prêmio Nobel da paz! Este personagem (...) foi o falecido físico Andrei Sakharov.


Ele ganhou seu Nobel em 1975 por exigir que fossem interrompidos o testes de armas nucleares. É claro que a dele já havia sido testada. Sua mulher era pediatra! Que tipo de individuo poderia aperfeiçoar uma bomba de hidrogênio enquanto estivesse casado com uma especialista em atendimento infantil? Que tipo de médica teria ficado com um companheiro capaz de uma resposta como a seguinte?


- Alguma coisa interessante hoje no trabalho, meu amor?

- Hum, hum. Minha bomba vai funcionar perfeitamente. E como você está indo com aquela criança que está com catapora?

            
Andrei Sakharov era uma espécie de santo em 1975, fato que não é mais celebrado agora que a guerra fria terminou. Ele era um dissidente na União Soviética. Clamou por um fim ao desenvolvimento e testes de armas nucleares e também por maior liberdade ao povo. Foi expulso da academia de ciências da União Soviética. Foi exilado de Moscou para uma minúscula comunidade numa região de solo permanentemente gelado.

            
Não lhe foi permitido ir a Oslo para receber seu prêmio da paz. Sua esposa pediatra, Elena Bonner, aceitou o prêmio em seu lugar. Mas, será que não está na hora de nos perguntarmos se ela, ou qualquer pediatra ou médico, não era mais merecedora de um prêmio da paz do que qualquer um que tivesse auxiliado na criação de uma bomba atômica para qualquer tipo de governo, não importa onde?

           
 Direitos humanos? O que poderia ser mais indiferente aos direitos de qualquer forma de vida do que uma bomba atômica?

            
Em junho de 1987, a Staten Island College na cidade de Nova York concedeu a Sakharov o título de doutor Honoris causa. Mais uma vez, o governo de seu país não quis permitir que ele viesse aceitá-lo pessoalmente. Eu fui convidado para representá-lo.

            
Tudo que eu precisava fazer era transmitir uma mensagem enviada por ele: “não desistam da energia nuclear.” Eu a recitei com um robô.

            
Com fui educado! É que isso ocorreu um ano após a calamidade nuclear mais letal que este planeta maluco havia presenciado até então: a de Chernobyl na Ucrânia. Crianças por todo norte da Europa adoecerão ou sofrerão as piores conseqüências nos anos futuros em decorrência daquele vazamento de radiação. Bastante trabalho para os pediatras!"


(Kurt Vonnegut, IN Timequake)

3/01/2013

RESENHA CRITICA Maria, Lzia de, Leitura e Colheita: Livros, leitura e formação de leitores. Petrópolis, RJ: Vozes. 2002.


 
    Se forem verificados os resultados a que chegam à escola, no que toca a alfabetização dos seus alunos, as conclusões seriam as mais tristes que se poderiam prevê, pois as escolas têm lançado mão, ainda na atualidade, de métodos a muito defasados e que não correspondem mais as necessidades dos indivíduos que nela se formam, nem aos anseios do mercado de trabalho.
 
    A escola, com sua forma tradicional de ensino, têm produzido seres humanos incapazes de dar conta das atuais demandas que lhe são conferidas, pois nessa conjuntura o mercado de trabalho exige do individuo que ele seja multifacetado no exercício de sua profissão e que possa, enfim, saber administrar, gerenciar, e, sobretudo, possa saber ler o mundo a sua volta. De acordo com Luzia de Maria (2002, pág. 15)
 
    É necessário interagir com a máquina, inserir dados, reagir conforme as etapas, reagir conforme as etapas do processo, realizar a correta leitura dos elementos apresentados, ter agilidade mental para interferir com rapidez e no momento exato. Enfim para corresponder a complexidade dos novos tempos, é necessário oferecer melhor formação àqueles que vão atuar nessa sociedade.
 
    Diante de tais problemas, quais são os desafios dos atuais educadores para reverter esse quadro? A professora Luzia de Maria, no capitulo de número um, do livro Leitura e Colheita, parece vislumbrar, a partir de uma analise construtivista, alguns resultados que podem corroborar para a melhoria no processo de ensino-aprendizagem da escola atual.
 
    Num primeiro momento a autora faz uma observação bastante salutar, no que toca a necessidade das novas exigências do mercado de trabalho, pois atualmente, entende-se que aquele profissional do passado, que era capaz de apenas operar um mecanismo da produção em série sem compreender todo o sistema ao qual estava ligado, já não mais tem espaço no mercado de trabalho, pois as necessidades do mercado mudaram e com elas mudam-se também a maneira de se formarem indivíduos aptos para o pleno exercício profissional.
 
    No mercado de trabalho do passado as mudanças eram relativamente lentas o que não exigia, por parte do operário, que ele se aperfeiçoasse sempre de uma nova gama de conhecimentos para dar conta de seu labor, mas na era da Revolução técnico-informacional as coisas são diferentes, pois a agregação de novas tecnologias faz com que o operário tenha sempre que lançar mão de conhecimentos com o qual, provavelmente, sequer entrou em contato durante toda a sua vida escolar, nesse sentido, será necessário, de acordo Luiza de Maria (2002, pag. 16):
 
    Construir conhecimentos, não apenas lhes oferecendo condições propicias para tal, mas também priorizando a autonomia enquanto condição essencial para que elas, fora do espaço escolar, dêem continuidade ao processo de aprender.
 
    A autora aponta como uma provável solução para essa problemática o investimento num trabalho maciço de pós-alfabetização, um trabalho que seja capaz de colocar o aluno em contato direto com a palavra escrita, que possa fazer do aluno um produtor de textos e levá-lo a tomar gosto pela leitura e exercer seu autodidatismo em toda a sua plenitude.
 
    Para que a escola possa formar alunos empoderados de autonomia suficiente para buscarem por si próprios conhecimentos necessários a existência, será preciso que professores de todas as séries entendam que ensinar uma criança a ser produtora de textos não significa, apenas, ensiná-la a decodificar o código lingüístico e sim fazer com que ela exercite a sua liberdade de expressão através da escrita e da leitura. Segundo Luzia de Maria (2002, pág. )
 
    Mas do que nunca se cobra da escola que saia da posição de simples “transmissora” de informações e assuma a formação de crianças aptas a construir conhecimentos, não apenas lhe oferecendo condições para tal, mas também priorizando a autonomia enquanto condição essencial para que elas, fora do espaço escolar, dêem continuidade ao processo de aprender.
 
    O posicionamento de Luzia de Maria, a respeito do processo de ensino-aprendizagem, encontra base teórica em muitos autores, dentre eles Jean Piaget, que entende que a produção de conhecimento só pode acontecer, de fato, de houver interação entre agentes cognitivos de leitura e as informações que estão sendo propiciadas aos indivíduos, ou seja, só pode haver aprendizado se o aluno estiver interessado naquilo que lê, ouve ou que escreve.
Maria, Luzia de, Leitura e Colheita: Livros, leitura e formação de leitores. Petrópolis, RJ: Vozes. 2002.
 
    Se fosse possível realizar uma avaliação panorâmica da escola na atualidade a que conclusões se chegaria? Essas conclusões seriam satisfatórias? Se não, quais medidas tomar frente a essas problemáticas? No segundo capitulo do livro Leitura e Colheita a professora Luzia de Maria procura responder a estas e outras indagações que se colocam diante de todos os estudiosos que têm pensado a educação neste tempo presente.
 
    Neste capitulo, Luzia de Maria trabalha a ideia de se repensar a escola enquanto instituição que segue a um determinado padrão, de repensá-la desde sua gênese até a sua atual formação, para enfim, fazer dela um instrumento que potencialize muitas vidas através da inserção de autonomia aos alunos. Sobre a origem da instituição escolar Luzia de Maria adverte:
 
    É bom lembrar que a instituição escola nasceu sob a influência moralista dos eclesiásticos do século XVII, *notadamente marcada por um regime de severa disciplina. Regime que resultou, nos séculos XVIII e XIX, no enclausuramento do internato, submetendo a criança a normas disciplinares cada vez mais rigorosas.
 
    Em seu texto Luzia de Maria se mostra avessa a ideia de que é necessário que haja silêncio em uma sala de aula para que possa haver aprendizado, pois segundo a autora o silêncio advém de uma forma um tanto quanto repressora e intimidadora que está no cerne da instituição escolar e que nada mais é se não o legado triste e cruel da origem moralista da escola.
 
    Para haver aprendizado se faz necessário que haja o diálogo, a discussão, a reflexão e a troca de informações entre professores e alunos e entre alunos e alunos, pois em uma sala de aula aonde o único a exercer o direito de tomar a palavra é o professor, o ensino, então está seriamente comprometido, uma vez que não existe interação e sim somente a imposição de ideias que, muitas vezes, não satisfazem os anseios dos alunos. Sobre o papel do professor na transformação da escola Luzia de Maria (2002, pág. 33) afirma:
 
    Neste sentido, a escola precisa ter professores muito bem preparados, não para que se despejem erudição sobre os alunos, mas que tenham noções acerca de como a aprendizagem se dá, para que, sabiamente e, pacientemente, sejam capazes de ouvi-las. Mais que ensinar, é preciso apenas que o professor não impeça a criança de aprender, que não deixe que se perca, no quotidiano escolar, a curiosidade natural das crianças.
 
    O professor que pretende mudar a realidade da escola atual precisa ter em mente que a educação deve ser um ato de transformação social e de ruptura com as velhas estruturas opressoras do passado, isso se ela possibilitar que se ouçam as vozes dos oprimidos, daqueles a quem o aparelho repressor do estado calou por longo período, sem lhes conceder a oportunidade de argumentação, do contrário o professor será somente mais um reprodutor da velha ordem estabelecida.
 
    Luzia de Maria compreende que é preciso que o educador entenda, de uma vez por todas, que o ato de ensinar é um ato político e que cabe ao educador fazer de seu aluno um indivíduo questionador, que seja capaz de ter o senso critico suficiente para examinar o mundo a sua volta, esse respeito Luzia de Maria escreve (2002, pág.39):
 
    A educação nunca é neutra. E nunca é demais repetir: educamos para a submissão, para a obediência cega e servil. Para a manutenção das estruturas vigentes ou educamos para a emancipação, para o questionamento, para o diálogo e a cooperação, para a mudança e a transformação.
 
    Se o cotidiano escolar for marcado por uma prática antidemocrática, se os currículos, as normas, a disciplina e o relacionamento interpessoal expressarem a opressão e o autoritarismo, qualquer discurso democrático será mero engodo, pura demagogia.
 
    O educador que quiser fazer a diferença na escola precisa praticar o letramento em sua sala de aula, precisar levar o seu aluno a ter prazer pela leitura e, sobretudo, o professor que quiser fazer a mudança em sua escola precisa começar a mudar a si mesmo, tornando-se ele mesmo um leitor ávido, capaz de lê não somente aquilo que está no livro didático, mas também o que está a sua volta como uma noticia no telejornal, um pronunciamento de algum político, uma propaganda em outdoor e enfim, o mundo a sua volta, pois somente ele poderá contagiar os seus alunos.

Resposta a uma questão de linguística baseada no livro a Lingua de Eulália, do professor Marcos Bagno.

Reflita e apresente um argumento próprio para justificar as atitudes contrárias ao preconceito que recai sobre as variedades não padrão.


O uso das variedades não-padrão são, em regras gerais, feito pelas camadas menos favorecidas da população, quer dizer, as pessoas que não representam a elite social ou intelectual. Nesse sentido é possível dizer que o desprestigio imposto as variedades não-padrão é fruto da relação de dominação que se estabelece entre classes sociais e que quando algum individuo sofre qualquer tipo de humilhação pelo modo que fala, na verdade, ele está sofrendo discriminação por conta de sua classe social, já que o seu modo de falar sugere, em certa medida, a sua classe social, sua origem, o seu meio e enfim a sua identidade individual. O preconceito linguístico é sem dúvida, o velho preconceito classista que tenta se impor de uma forma ou de outra e por essa razão não deve ser tolerado.